Verity (Colleen Hoover)
Capítulo Quatro
byCapítulo Quatro
Preciso dar o braço a torcer: elas estavam mesmo determinadas a sobreviver.
Nada do que fiz funcionou. A tentativa de aborto, os comprimidos, a queda “acidental” da escada. Fiz todo esse esforço e o único resultado foi uma pequena cicatriz na bochecha de uma das crianças. Uma cicatriz que, tenho certeza, era minha culpa. Uma cicatriz sobre a qual Jeremy não calava a boca.
Quando já estávamos no quarto, poucas horas depois do parto — uma cesárea, graças a Deus —, o pediatra veio examinar as meninas. Fechei os olhos, fingindo que dormia, porque estava com medo de interagir com o pediatra. Achei que ele veria claramente que eu não tinha a menor ideia de como ser mãe daquelas coisas.
Jeremy perguntou ao médico sobre a cicatriz. Ele minimizou o problema e disse que era normal que gêmeas idênticas se arranhassem dentro do útero. Mas Jeremy não ficou satisfeito.
— É muito profundo para ser um arranhão.
— Pode ser uma cicatriz de tecido fibroso — respondeu o médico. — Não se preocupe, com o tempo vai ficar mais apagada.
— Não estou preocupado com a estética — rebateu Jeremy, meio na defensiva. — Minha preocupação é que seja algo mais sério.
— Não é. Suas filhas são completamente saudáveis. As duas.
Vai entender.
O médico saiu, a enfermeira também, e então ficamos apenas Jeremy, as meninas e eu. Uma delas estava dormindo naquela cama transparente — não sei como se chama. Jeremy estava segurando a outra. Olhava para ela e sorriu quando percebeu que eu estava de olhos abertos.
— Olá, mamãe.
Por favor, não me chame assim.
Sorri para ele, apesar de tudo. Ele ficava bem no papel de pai. Parecia feliz. O problema é que essa felicidade não tinha nada a ver comigo. Mesmo com ciúmes, aquilo me agradava. Ele provavelmente seria o tipo de pai que troca fraldas e ajuda a alimentá-las. Sabia que a cada dia ia gostar mais daquele lado dele. Só precisava me acostumar com aquilo. Com a ideia de ser mãe.
— Cadê a da cicatriz?
Jeremy fez uma careta, chateado com a minha escolha de palavras. Podia ser um jeito estranho de chamá-la, mas ainda não tínhamos escolhido os nomes. A cicatriz era o único jeito de identificá-la.
Ele a pegou no colo e colocou em meus braços. Olhei para ela esperando aquela torrente de emoções, mas não senti nem uma cosquinha. Passei os dedos pela cicatriz em sua bochecha. Acho que o cabide não era forte o suficiente. Talvez devesse ter usado algo que não dobrasse com a pressão. Uma agulha de tricô, quem sabe? Mas não sei se seria comprida o bastante.
— O médico disse que a cicatriz pode ser de um arranhão — contou Jeremy, rindo. — Já estavam brigando antes mesmo de nascer.
Sorri para ela. Não porque queria sorrir, mas porque é o que se esperava que eu fizesse. Não queria Jeremy pensando que eu não estava tão apaixonada por ela quanto ele. Peguei na mão dela com meu dedo mindinho.
— Chastin — sussurrei. — Você pode ficar com o nome mais bonito já que sua irmã foi tão má.
— Chastin. Amei — disse Jeremy.
— E Harper. Chastin e Harper.
Eram dois dos nomes que ele havia me mandado. Achei bons o suficiente. Escolhi estes porque Jeremy os mencionou mais de uma vez, então imaginei que estivessem no topo de sua lista. Talvez se ele percebesse o quanto eu o amava, não ia notar que faltava amor para as outras duas pessoas envolvidas.
Chastin começou a chorar. Estava se contorcendo em meus braços e eu não sabia muito bem o que fazer. Comecei a balançá-la, mas aquilo me incomodava, então parei. O choro foi ficando mais alto.
— Talvez ela esteja com fome — sugeriu Jeremy.
Eu tinha certeza de que elas não sobreviveriam ao parto depois de tudo que fiz, então nem pensei muito no que seria preciso fazer depois que nascessem. Sei que amamentá-las seria a melhor opção, mas não tinha a intenção de submeter meus seios a esse tipo de sacrifício. Ainda mais com duas delas.
— Parece que alguém está com fome — disse a enfermeira, quase saltitando ao entrar no quarto. — Você vai amamentar?
— Não — respondi imediatamente. Queria que ela saltitasse para fora dali.
Jeremy me olhou, preocupado.
— Tem certeza?
— Elas são duas.
Não gostei do olhar de Jeremy, como se estivesse decepcionado comigo. Não aguentava imaginar que seria assim a partir de agora. Ele vai ficar do lado delas. Eu não tenho mais importância.
— Não é mais difícil do que dar a mamadeira — opinou a Enfermeira Saltitante. — É até mais cômodo. Quer tentar?
Não tirei os olhos de Jeremy, esperando que ele me liberasse daquela tortura. Eu não me sentia bem sabendo que ele preferia a amamentação, embora houvesse diversas alternativas ótimas. Mas concordei e baixei a alça do vestido porque queria agradá-lo. Queria ele satisfeito com a mãe de suas filhas, embora eu não estivesse nada satisfeita com aquilo.
Tirei o sutiã e trouxe Chastin para perto do mamilo. Jeremy ficou admirando o tempo inteiro. Viu enquanto ela se agarrava ao meu mamilo. Viu sua cabeça se movendo para frente e para trás, a mãozinha segurando minha pele. Viu quando ela começou a sugar.
Aquilo parecia muito errado.
Uma criança sugando algo que Jeremy costumava chupar antes. Não gostei. Como ele poderia achar meus seios atraentes depois de ver aqueles bebês se alimentando deles todos os dias?
— Machuca? — perguntou Jeremy.
— Não exatamente.
Ele pôs a mão em minha cabeça, ajeitando meu cabelo para trás.
— Parece estar sentindo dor.
Não é dor. É nojo.
Fiquei olhando enquanto Chastin continuava se alimentando. Meu estômago revirou, mas fiz o possível para não mostrar o quão repugnante aquilo era para mim. Tenho certeza de que muitas mães acham esse momento lindo. Eu acho perturbador.
— Não consigo fazer isso — murmurei, deixando a cabeça cair no travesseiro.
Jeremy tirou Chastin do peito. Dei um suspiro de alívio ao me ver livre dela.
— Tudo bem — disse Jeremy, compreensivo. — Vamos usar fórmula.
— Tem certeza? Ela parecia estar pegando bem o peito — insistiu a enfermeira.
— Certeza absoluta. Vamos de fórmula.
A enfermeira concordou e saiu do quarto dizendo que ia buscar uma lata de Similac.
Sorri. Meu marido ainda me apoiava. Estava ao meu lado. Eu fui a prioridade naquele momento, e fiquei feliz com isso.
— Obrigada.
Ele beijou a testa de Chastin, pegou-a no colo e se sentou à beira da cama. Olhava para ela com uma expressão incrédula.
— Como posso me sentir tão protetor em relação a essas meninas que só conheço há poucas horas?
Queria lembrá-lo de que sempre foi muito protetor em relação a mim, mas não parecia o melhor momento para dizer isso. Eu me sentia quase uma intrusa nesse vínculo de pai e filha onde eu nunca estaria incluída. Ele já a amava mais do que a mim. Eventualmente acabaria ficando do lado dela, mesmo quando eu estivesse certa. Era tudo muito pior do que eu havia imaginado.
Ele limpou uma lágrima com a mão.
— Você está chorando?
Ele virou imediatamente a cabeça para mim, chocado com a pergunta. Entrei em pânico, mas consertei.
— Soou estranho. Desculpe. Eu perguntei de um jeito positivo. Amo o quanto você as ama.
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