Verity (Colleen Hoover)
Capítulo Cinco
byCapítulo Cinco mostra como a rotina se transformou num ciclo exaustivo e emocionalmente desgastante após o nascimento das gêmeas. A sensação de colapso iminente era constante. Entre o choro alternado das bebês, a fome incessante e o sono escasso, a exaustão não dava trégua. Jeremy ajudava o quanto podia, dividindo as tarefas sempre que estava em casa, mas cuidar de dois recém-nascidos exigia mais do que força de vontade — era uma provação física e mental. Com apenas um bebê, talvez houvesse algum alívio, mas com duas, a impressão era de que não havia descanso, nem espaço para respirar.
Durante as primeiras semanas, Jeremy tentou conciliar seu trabalho como corretor de imóveis com a nova rotina em casa. Tirou duas semanas de licença, mas logo precisou voltar, pois não havia dinheiro para contratar ajuda. O adiantamento do primeiro livro publicado pela narradora não cobria quase nada, o que aumentava sua ansiedade. Curiosamente, o retorno de Jeremy ao trabalho trouxe um inesperado alívio: ela conseguiu reorganizar a própria rotina. Ao colocá-las no berço e desligar a babá eletrônica, ela retornava para a cama, isolada com seus protetores auriculares. A solidão imposta pela maternidade transformou-se, para ela, numa espécie de estratégia de sobrevivência.
Essa nova rotina permitiu que ela recuperasse o sono durante o dia e fingisse uma performance de equilíbrio quando Jeremy chegava à noite. Alimentava, dava banho e simulava uma rotina funcional antes que ele entrasse pela porta. O cansaço das crianças, causado por um dia inteiro de choro ignorado, fazia com que dormissem melhor à noite. Isso, por sua vez, oferecia a ela a oportunidade de trabalhar em sua escrita, o que mantinha sua carreira em andamento. Ainda que tudo fosse baseado em uma construção de aparências, ela sentia que havia reencontrado algum controle sobre sua vida. Isso, de certa forma, a fazia acreditar que estava se saindo bem, mesmo que à custa do sofrimento das filhas.
Um detalhe que ainda a preocupava era a intimidade com Jeremy, especialmente porque o médico não havia liberado relações sexuais por conta da cesariana. Apesar disso, ela temia que a falta de conexão física afetasse negativamente o casamento. Via o sexo como um elo vital, cuja ausência poderia comprometer o restante da relação, como uma infiltração silenciosa que corrói as estruturas de dentro para fora. Tentou reatar essa conexão íntima, mesmo sem aprovação médica, mas Jeremy hesitou, preocupado com a sua recuperação. O receio dele, embora compreensível, despertou nela uma inquietação sobre como manter viva essa parte do relacionamento.
Muitas mães enfrentam esse tipo de conflito nos primeiros meses do puerpério — uma realidade raramente abordada de forma honesta. A pressão para ser produtiva, manter um casamento saudável e ao mesmo tempo ser uma cuidadora impecável pode se tornar insustentável. Estudos mostram que a privação de sono contínua, aliada à sobrecarga mental, pode desencadear transtornos como a depressão pós-parto, afetando até 15% das mulheres, segundo a Organização Mundial da Saúde. O que a narradora vive é um reflexo desse colapso silencioso que muitas mulheres sentem, mas raramente confessam. No seu caso, a escrita torna-se tanto um refúgio quanto uma válvula de escape.
O leitor, então, é levado a questionar: até que ponto é justificável ignorar os próprios filhos para manter a sanidade? Seria essa uma demonstração de falha moral ou uma forma de autopreservação? A protagonista não se vê como uma má mãe, mas como alguém fazendo o possível para não desaparecer sob o peso da maternidade. Mesmo assim, a distância emocional entre ela e as crianças é nítida. Elas não são vistas como extensões de seu amor, mas como obstáculos silenciosos em seu caminho. A empatia do leitor oscila entre julgamento e compaixão, pois embora os atos descritos sejam difíceis de aceitar, a dor contida nas entrelinhas é palpável.
Conforme a narrativa se desenrola, a vulnerabilidade da protagonista fica evidente. Seu medo de perder Jeremy, de falhar como mãe e de se perder como mulher estão todos interligados. Não se trata apenas de negligência, mas de uma luta desesperada para preservar sua identidade diante de um papel que a consome. A maternidade não é idealizada aqui — é árdua, confusa e muitas vezes cruel. E ainda que suas escolhas sejam questionáveis, a sinceridade com que ela as relata cria uma conexão desconfortável, porém real, com o leitor. A sensação é de estar diante de alguém que grita por socorro em silêncio, mas que aprendeu a disfarçar a dor com aparências de normalidade.
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