Verity (Colleen Hoover)
Capítulo 5
byCapítulo 5 começa com a tensão se intensificando conforme a narradora ultrapassa os limites do aceitável. Ela já não está apenas folheando a vida de Verity – está mergulhando nas partes mais íntimas de sua existência, tanto literal quanto emocionalmente. A decisão de continuar lendo o manuscrito reflete não apenas curiosidade, mas também uma espécie de compulsão por compreender quem Verity realmente foi. Mesmo ciente de que está invadindo algo que não lhe pertence, o desejo por respostas a leva a ignorar os próprios limites. Cada página representa não apenas um trecho da vida de Verity, mas um espelho da obsessão crescente da narradora. Ler uma autobiografia brutalmente honesta se torna uma armadilha emocional, onde empatia, julgamento e fascínio se misturam.
Ao ouvir sons vindos do andar de cima, o pânico rapidamente assume o controle. O barulho do leito hospitalar é inicialmente interpretado como algo indecente, revelando o quanto a mente da narradora está condicionada pelo que leu. Quando Jeremy aparece e esclarece a situação, o alívio físico e emocional é imediato, embora o constrangimento a consuma. O corpo reage à tensão com sinais visíveis – rubor, placas vermelhas –, tornando impossível esconder sua vulnerabilidade. O simples gesto de Jeremy oferecer comida a coloca em uma posição desconfortável, especialmente porque ele parece não ter ideia do turbilhão interno da narradora. Pequenos gestos, como dividir uma pizza, ganham novas camadas de significado diante da bagagem emocional entre eles.
Conversas banais rapidamente se tornam confessionais. Ao falarem sobre Verity, a série e o acidente, surgem novas informações que preenchem lacunas importantes. Jeremy fala de maneira serena, mesmo ao lembrar do trauma, o que só intensifica a complexidade do luto que ambos carregam. Há uma troca de empatia entre os dois – histórias sobre perdas pessoais os conectam, criando um ambiente de entendimento silencioso. Mas a narradora continua inquieta, presa entre o que sabe do manuscrito e o homem que está diante dela. Sua mente oscila entre empatia e suspeita, refletindo uma dualidade constante: acreditar ou duvidar.
Quando Jeremy relembra como conheceu Verity, surge uma nostalgia que contrasta fortemente com a realidade atual. A imagem da mulher no vestido vermelho, cheia de vida, é quase irônica quando comparada à figura inerte que hoje habita a casa. A lembrança de um começo romântico traz à tona a dor de tudo que foi perdido. A narradora, presa ao papel de observadora, sente-se cada vez mais deslocada, como se invadisse um passado que não lhe pertence. Ainda assim, ela se vê atraída pelas memórias compartilhadas, pelas histórias que revelam quem Verity foi – ou quem Jeremy acredita que ela era. Cada frase dita por ele é analisada, comparada ao que foi lido no manuscrito.
A questão sobre o manuscrito e o quanto é real ou ficção paira no ar. A narradora especula sobre a possibilidade de Jeremy ser apenas um nome usado temporariamente, algo que autores costumam fazer. Essa dúvida a impulsiona a buscar mais pistas, pois entender se o conteúdo do manuscrito é autobiográfico ou imaginativo se torna essencial. Quando pergunta diretamente como Jeremy e Verity se conheceram, o relato parece espontâneo, mas é impossível saber se há edições na história. É nesse ponto que o leitor também começa a desconfiar: o que é verdade? O que foi inventado? A narrativa brinca com essa ambiguidade, envolvendo tanto a personagem quanto o leitor nessa incerteza.
A fala de Jeremy sobre Verity ser sociável, amante dos holofotes, contrasta com sua situação atual de isolamento e silêncio. Ele, por outro lado, se define como alguém reservado, mais confortável com as crianças e longe da fama. A diferença de temperamentos entre eles parece gritante, e talvez tenha sido essa disparidade que moldou o casamento. A menção às filhas falecidas carrega um peso devastador, principalmente quando ele se corrige para falar apenas de Crew. É nesse instante que a dor real transparece, e não parece mais ensaiada ou manipulada. Pequenos detalhes, como encontrar objetos das meninas pela casa, ampliam o sentimento de luto que permeia o ambiente.
O comportamento da narradora também muda. Ela observa, analisa e até se sensibiliza, mas não consegue deixar de lado o instinto investigativo. Saber que escreve livros de suspense a coloca numa posição única – entre a empatia e o ceticismo. Ela entende que tragédias, quando muito bem contadas, podem esconder motivações obscuras. Mesmo que Jeremy pareça sincero, ela continua dividida entre confiar e desconfiar. E esse conflito interno é o que torna sua jornada tão instigante para o leitor.
Esse trecho do livro também suscita uma reflexão útil: como interpretamos a dor alheia? Em situações de perda, é comum que cada indivíduo tenha uma forma distinta de lidar com o luto – alguns se fecham, outros contam histórias. A dúvida da narradora, e a nossa enquanto leitores, é se estamos diante de uma história trágica ou de um encobrimento bem arquitetado. Isso levanta uma questão ética sobre julgamentos precoces e o impacto de informações incompletas. Em tempos de superexposição, onde qualquer narrativa pode parecer convincente, vale lembrar que nem sempre as versões mais emocionantes são as mais verdadeiras.
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